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domingo, 9 de dezembro de 2012
Expectativas ocultas que afetam o seu relacionamento: como você lida com elas
Expectativas ocultas que afetam o seu relacionamento: como você lida com elas?
Ailton Amélio
Cena do seriado televisivo “Big Bang Theory”:
Howard e Bernadette vão morar juntos. Logo na primeira noite, quando eles estão se preparando para dormir, Howard inicia um diálogo que tem um conteúdo mais ou menos assim:
- Amanhã vamos ao dentista.
- Como? Você espera que eu vá ao dentista consigo?
- A minha mãe vai sempre comigo.
- Você tem detergente antialérgico?
- Tenho. Por quê?
- Ainda bem! Use-o, então, quando for lavar as minhas cuecas.
- Você espera que eu lave as suas roupas?
- Claro! Elas não se lavam sozinhas!
Mais algumas tiradas deste tipo, ela explode!
- Não vou fazer o papel da sua mãe!
- Claro que não! Jamais esperaria isso!
Howard espera que Bernadette desempenhe para ele várias tarefas que até agora eram desempenhadas pela sua mãe. Talvez, ele tenha concluído que eram “tarefas de mulher”. Ela, ao contrário, espera um relacionamento igualitário entre eles, onde ambos tenham os mesmos direitos e deveres.
Howard e Bernadette, no diálogo apresentado acima, estão se deparando com uma situação nova pela primeira vez. Embora já namorem há algum tempo, ainda não haviam enfrentado aquelas situações que estão sendo tratadas: quem lava as roupas, o sabão contra a alergia do Howard, acompanhá-lo ao dentista...
Eles não tinham consciência de que poderiam alimentar expectativas diferentes sobre as funções que cada um deveria desempenhar em cada uma destas situações. Howard está muito enganado quanto ao que pode esperar de uma esposa moderna e precisa rever, de uma forma profunda, as suas expectativas: um estudo recente mostrou que quase a totalidade das mulheres americanas querem relacionamentos igualitários, no quais homens e mulheres têm obrigações e desempenhem papéis similares. A maioria dos homens também afirma que quer esse igualitarismo. Na prática, uma grande parte das mulheres ainda exerce mais funções domesticas do que os homens, mesmo quando elas trabalham fora e ganham tanto dinheiro quanto eles.
Essas expectativas de homens e mulheres quanto àquilo que esperam oferecer e receber em um relacionamento amoroso e as encrencas que acontecem quando elas discrepam em pontos importantes é o tema que vamos abordar neste artigo.
Expectativas e contratos que regem os relacionamentos
Qualquer relacionamento é regido por uma quantidade imensa de contratos que podem ser explícitos ou implícitos, conscientes, semi-inconscientes ou inconscientes. As partes, ao assumirem um determinado tipo de relacionamento, aceitam, com graus variados de consciência, o compromisso se comportar das formas que ele prevê e esperam que a outra parte faça o mesmo.
Estas regras mudam de acordo com o tipo de relacionamento. Por exemplo, seria possível montar um código de conduta sobre as “formas como desconhecidos devem se tratar em locais públicos” (regras para evitar colisões entre pedestres, normas para não perturbar o outro em publico, regras para a ocupação de lugares em um cinema semivazio, dever de prestar informações para desconhecidos, etc.), regras para lidar com colegas de trabalho (cumprimentar, reconhecer os direitos e deveres de cada cargo, mostrar-se simpático, etc.), regras para lidar com amigos (convidar para festas, informa-los antecipadamente sobre decisões importantes, socorrê-los em emergências, compartilhar sentimentos, etc.), direitos e deveres dos namorados (exclusividade sexual e romântica, contar com a companhia do namorado para os principais tipos de lazer, compartilhar informações sobre decisões importantes, etc.).
Contrato explícito de casamento
Algumas regras do casamento são explícitas, reguladas por leis e garantidas por sanções legais, em caso de descumprimento. Elas regulam, por exemplo, direitos e deveres econômicos de cada cônjuge, direitos e obrigações com os filhos, motivos legais para a dissolução do matrimônio, etc.
Existem diferentes opções de contrato nesta área: casamento com comunhão parcial de bens, com comunhão total de bens, pactos antenupciais (os cônjuges estipulam cláusulas que não inflijam outras leis, que não estavam incluídas nas fórmulas padrões de casamento).
Direitos e deveres dos cônjuges regidos pelos “usos e costumes”
Uma quantidade muito grande de direitos e deveres dos cônjuges não está escrita em nenhum lugar e é regida pelos usos e costumes da cultura onde ele está inserido (“direito consuetudinário”).
O grau de consciência dessas regras sustentadas pelos usos e costumes é muito variado: algumas são facilmente citadas e outras só ficam conscientes quando são infligidas.
Estas regras tanto podem ser usadas pelo sistema legal para tomar decisões (um juiz pode levar em conta esse tipo de norma para condenar ou absolver alguém através da avaliação se aquilo que ele fez está de acordo com os usos e costumes da sua comunidade), mas é usada, principalmente, pelos membros da cultura para regular os comportamentos de seus membros e aplicar recompensas e punições para aqueles que as cumprem ou as deixam de cumprir tais normas. Por exemplo, dependendo das ações e atitudes de uma pessoa quanto ao sexo extraconjugal, ela pode ser classificada como “desleal”, “sem vergonha”, “galinha” e ser rejeitada como amiga íntima pelas pessoas do seu circulo de relacionamento. Essa sua forma de agir também pode ter consequências em outras áreas porque muitas pessoas creem que aquilo que aquilo que ela faz com seu cônjuge, ela também tenderá a fazer com os sócios de um negócio (“Ela não presta”).
Como a cultura é diversificada, existem muitas normas diferentes, até contraditórias, que são adotas pelos seus subgrupos ou, em certos casos, de acordo com as conveniências dos maus intencionados. Essas diferenças podem dar margem a desentendimentos quando um cônjuge lastreia as suas expectativas em normas diferentes daquelas adotadas pelo outro cônjuge.
Direitos e deveres eletivos regidos por acordos particulares entre os cônjuges
Muitas regras que regem um relacionamento são criadas apenas com base nas preferencias pessoais dos cônjuges e nas negociações que aconteceram entre eles. Ou seja, elas não foram baseadas nem no sistema legal, nem os usos e costumes da cultura ou das subculturas dos cônjuges. Neste caso, a qualidade do relacionamento, as características de personalidade e a historia de vida pessoal e do casal é que determinam as expectativas de cada cônjuge, as atitudes que vão adotar face aos desacordos e forma como vão negociar suas divergências.
Muitas dessas normas e expectativas não são suficientemente conhecidas pelos parceiros antes de assumirem os compromissos conjugais e, muitas vezes, elas só ficam conscientes quando há divergência ou surge um fato novo aos quais essas normas se aplicam pela primeira vez.
Como diminuir as surpresas
Para evitar as surpresas do tipo daquelas deparadas por Howard e Bernadette, logo no primeiro dia que foram morar juntos, ajuda:
Iniciar relacionamentos com pessoas já conhecidas ou que formam apresentadas. Cerca de 70% dos namoros começam assim entre conhecidos ou entre pessoas que foram apresentadas por conhecidos em comum. Quando você conhece um possível parceiro ou outras pessoas do meio que ela vive, antes de iniciar um relacionamento amoroso, você tem acesso a mais informações sobre ele.
Namorar por um tempo razoável. Existem evidencias de que os compromissos que foram precedidos por um tempo muito curto ou muito longo de namoro têm menos chance de durar.
O namoro ajuda, em parte, a conhecer essas peculiaridades do parceiro. Ajuda só em parte porque nunca conhecemos bastante o parceiro, por mais que convivamos com ele. Existem estimativas que casados há mais de vinte anos só conhecem cerca de 50% do outro.
Conhecer o parceiro em diversas situações. Aqueles namorados que só se encontram de vez em quando e apenas em situações de lazer, conhecem menos seus parceiros do que aqueles que convivem entre si em uma grande diversidade de situações.
Conversar e negociar sobre situações previstas que só aparecerão no futuro. Conversar sobre essas situações ajuda a decidir se o parceiro é compatível e se é possível negociar com ele os pontos mais sérios de divergência. Este tipo de conversa é necessária em pontos importantes que são previstos em qualquer relacionamento duradouro, tais como:
- Cuidar da casa
- Responsabilidades pelos rendimentos
- Política de poupança e gastos
- Administração do dinheiro
- Filhos: opção por tê-los e quantos seriam
- Espaços para as liberdades individuais: quanto e como cada membro do casal espera compartilhar áreas da vida com o outro ou ter graus de liberdade.
Quando há divergência de expectativas
Quando há divergência quanto há forma de lidar com situações novas, cada membro do casal tenta a justificar as suas expectativas nos nas normas legais e nos usos e costumes.
Uma atitude imprescindível que deve ser adotada quando há divergências é partir do pressuposto que ela está acontecendo devido a expectativas inconscientes e divergentes de ambas as partes e não que ela esteja ocorrendo porque o parceiro é injusto, mal intencionado e aproveitador.
Como é impossível e indesejável prever tudo, antes de assumir um compromisso que tenha implicações muito sérias, é imprescindível verificar se o parceiro é um negociador assertivo, construtivo, leal, generoso e que vai colocar a sobrevivência e a qualidade do relacionamento acima de divergências episódicas. Essas qualidades pessoais são imprescindíveis para que um relacionamento dê certo. Por mais que escolhamos o parceiro, por melhor que conheçamos as suas expectativas, por mais que prevejamos e negociemos aquelas situações que ocorrerão durante um relacionamento duradouro, é inevitável que a todo o momento surjam situações novas e o casal deve ser capaz de negociá-las de tal forma que ambos fiquem satisfeitos e o relacionamento saia mais fortalecido.
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