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sábado, 27 de setembro de 2014
Entenda a diferença entre opção e orientação sexual
Entenda a diferença entre opção e orientação sexual
Edson Toledo
"Quando uma pessoa opta por algo, ela faz uma escolha entre várias ou, no mínimo, entre duas possibilidades. As pessoas com orientação homossexual não optam por se apaixonar e se relacionar intimamente com pessoas do mesmo sexo."
Antes de iniciarem a leitura deste texto, sugiro que se dispam, previamente, de seus preconceitos e compreendam que, primeiramente, estaremos tratando de questões que envolvem diretamente pessoas, na perspectiva dos direitos humanos constituídos e fundamentados na Constituição da República Federativa do Brasil quando diz, sobretudo, que um dos objetivos fundamentais é "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação" (Art. 3º, IV).
O senso comum, baseado em crenças e valores pessoais, fundamenta argumentos como o que confunde opção sexual com orientação sexual, proferidos por grande parcela da população independentemente de outras variáveis sociais como: classe, gênero, intelectualidade, geração. Entretanto, há diferença entre opção e orientação sexual.
Quando uma pessoa opta por algo, ela faz uma escolha entre várias ou, no mínimo, entre duas possibilidades. As pessoas com orientação homossexual não optam por se apaixonar e se relacionar intimamente com pessoas do mesmo sexo. Em primeiro lugar porque se pudessem, provavelmente, não optariam por ser alvo de ações, comentários ou olhares preconceituosos e discriminatórios, uma vez que a regra dominante é a heterossexualidade. Em segundo lugar, porque o desejo afetivo-sexual dessa pessoa é orientado a pessoas do mesmo sexo, assim como ocorre na heterossexualidade, em que o desejo afetivo-sexual da pessoa é orientado a pessoas do sexo oposto. Com isso, pode-se entender que se existe alguma espécie de preferência na homossexualidade não é a de se relacionar com uma pessoa do mesmo sexo em detrimento de outra do sexo oposto, mas sim em assumir isso publicamente ou não.
De acordo com *Fernando Luiz Cardoso, "o conceito de orientação sexual (...) [pode ser] relativizado como as muitas possibilidades de prazer. Assim, orientação sexual não é o mesmo que prática sexual (aquilo que as pessoas fazem no sexo) e nem identidade sexual (como as pessoas se sentem ou são nominadas a partir de suas práticas sexuais)". Esse é mais um dos equívocos construídos que corroboram para reforçar o preconceito sobre pessoas não heterossexuais.
Isso posto vamos a questão objeto deste nosso artigo, O National Guideline Clearinghouse - base de dados de diretrizes para as práticas clínicas baseadas em evidência - é um recurso público mantido pela Agency for Healthcare Research and Quality do Departamento de Saúde do Governo Americano que edita uma serie de diretrizes para tratar de assunto tão difícil e polêmico como questões relacionadas à sexualidade da criança e do adolescente.
Abordagem:
A avaliação da sexualidade é um fator essencial para um tratamento global e efetivo.
Avaliação psiquiátrica de todo paciente deve levar em consideração seu desenvolvimento psicossexual. No caso de crianças e adolescentes não é diferente e a abordagem da orientação sexual, da identidade e do papel de gênero ajuda a identificar situações específicas relacionadas à sexualidade. Assim, é possível trabalharmos na prevenção de problemas clínicos e psiquiátricos e na promoção de qualidade de vida.
A história desses pacientes deve ser obtida de forma neutra, sem julgá-los.
Deve se levar em consideração que crianças e adolescentes que se apresentam com orientação sexual "não concordantes" estão em situação de vulnerabilidade e apresentam desafios únicos durante seu desenvolvimento psicossexual. Uma das questões fundamentais é destacar ao paciente que a confidencialidade sobre a sua orientação sexual será mantida, fato esse essencial na formação do vínculo terapêutico.
Atenção:
Após obtenção da história e análise da vulnerabilidade os profissionais de saúde devem estar atentos para os seguintes aspectos, que trazem risco para a criança/adolescente:
- Bullying: a exposição regular à hostilidade por parte de colegas e família pode levar o indivíduo a experimentar efeitos adversos na sua saúde mental como depressão crônica, ansiedade e pensamentos suicidas. Há evidências que escolas que implementam programas específicos para o bullying tendem a diminuir sua incidência. Caso o comportamento esteja arraigado na família, terapia familiar pode ajudar.
- Suicídio: se verifica mais taxas de suicídio nesse grupo quando comparado com população em geral. Apoio social e familiar, além de programas escolares de prevenção de suicídio são importantes fatores de proteção.
- Comportamentos de risco: um apoio psicossocial falho pode favorecer o envolvimento com prostituição e aumento das taxas de gravidez indesejada.
- Abuso de substâncias: aumento do risco de abuso de álcool e drogas, particularmente, naquelas crianças e adolescentes com dificuldade de trabalhar sua orientação sexual ou com dificuldade de inserção no meio social.
- HIV e outras doenças de transmissão sexual: psicoeducação e discussão sobre como ter experiências sexuais mais seguras ajudam a diminuir esse risco aumentado.
Concluo, citando a frase da letra da música do cantor Belchior: "ainda somos os mesmos de vivemos como nossos pais...". Penso que frase como esta faz com que reflitamos sobre questões ligadas às relações humanas e que estamos assistindo e participando de grandes mudanças no mundo globalizado marcados por avanços tecnológicos, comunicação de massa, engenharia genética e por ai vai. Porém, se repararmos no campo das microrrelações do cotidiano humano e das subjetividades, pouco se avança... entendo que talvez devêssemos iniciar por ai para entendermos as questões ligadas à sexualidade de nossas crianças e adolescentes.
Duas definições importantes:
- Identidade de gênero: definição sexual, senso que o indivíduo tem de sua masculinidade ou feminilidade.
- Papel de gênero: deriva da identidade de gênero e é construído de forma cumulativa por influências parentais e socioambientais. É esperado que o indivíduo adote o papel masculino ou feminino, de modo a se identificar com o sexo que lhe foi designado.
* Doutor em Sexualidade Humana, Núcleo de Estudos da Sexualidade - NES, Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC.
**Forlenza & Miguel (ed). Compêndio de Clínica Psiquiátrica. Manole, 2012.
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