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quinta-feira, 2 de maio de 2013

Ninguém quer ser papa

Ninguém quer ser papa A renúncia do guardião de antigas tradições de fé não é mais um caso, talvez possa ser uma situação limite, revelando o que Lacan chama de “declínio da função social da imago paterna” Christian Ingo Lenz Dunker Gonçalo Viana A recente renúncia do papa Bento 16 iluminou uma constatação amarga. Não só a racionalidade germânica contribuiu para que, na ausência de forças para desenvolver a tarefa, fosse melhor passá-la para outro mais qualificado. No discurso de cardeais e nos depoimentos dos especialistas em Vaticano aparece a desagradável impressão de que ninguém quer ser o sucessor de Pedro. Muito trabalho, pouca autonomia, excesso de exposição, sem a devida compensação em termos de qualidade de vida. Estas poderiam ser as considerações de alguém que segue uma carreira qualquer. Max Weber (1864-1920) teorizou esse processo de racionalização em termos da divisão progressiva entre diferentes tipos de ação (Handeln). A vida moderna seria cada vez mais tensionada pela dissociação do comportamento orientado, respectivamente: (1) por fins ou objetivos pretendidos; (2) por valores éticos, estéticos ou políticos; (3) pela alteração de atitudes e estados de humor; (4) por hábitos e tradições. Das modalidades de ação deduz-se a existência de tipos ideais que – seguindo a tendência geral de especialização – engendram formas de vida orientadas preponderantemente para uma única modalidade de ação. O homem de negócios, para quem os fins justificam os meios; o artista engajado, para quem os meios são os fins; o publicitário que cria tendências de ação e o zelador de costumes seriam exemplos atuais desses tipos. Ocorre que a função de papa é uma objeção, até então muito resistente, desta tendência de segmentação do individualismo descrita por Weber. Ele é o dirigente maior do Estado do Vaticano e de seus negócios. Sua forma de vida deve ser exemplar e sacrificial. Espera-se que atue como líder intelectual e espiritual formador de respostas para os novos tempos. É o mantenedor e guardião de antigas tradições de uma comunidade de fé. A renúncia do papa não é mais um caso, talvez o caso limite, aquilo que Lacan chamava de “declínio da função social da imago paterna”. Mas atenção. O rebaixamento não está entre as imagens do pai – humilhado, impotente e agora demissionário –,mas faz parte da função social dessas imagens. Esse complexo de imagens em uma articulação específica, chamada por Jung e depois por Freud de imago, deixa de ser um articulador referencial dos laços sociais. Em seu lugar surgem, “weberianamente”, discursos que prescindem do semblante de autoridade paterna. A renúncia papal pode ser comparada com a dos jovens que recusam uma carreira de trabalho infinito, sem satisfação ou prazer; ou com a das mães executives que resistem a ascender na empresa para poder aproveitar mais a convivência com seus filhos; ou com a do artista independente que prefere não ceder ao “sistema das artes”; ou ainda com a de todos aqueles que suspendem o agir pela tradição. Como Barthelby, o escrivão descrito por Melville (1819-1891) que se recusa a aceitar as ordens no escritório onde trabalha apesar de continuar a frequentá-lo regulamente, como um bom funcionário, o papa disse: “I would prefer not to” (Eu preferiria não ter). Isso introduz e simboliza uma nova tendência na inexorável marcha da racionalização individualista. Depois do pai freudiano que dizia um duplo não (“seja como eu, não seja como eu”) veio o noms-du-père lacaniano, que combinava nome (nom) e não (non) como essência de sua função. Agora temos uma espécie de pai Noh (lembremos que no antigo teatro Noh japonês o protagonista é o único a usar máscara). Um pai que não está mais disposto a ser o único a unir, por meio de seu semblante, os diferentes tipos ideais. Os pais demissionários deixam a Sé vacante ... e assim será daqui em diante.

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