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domingo, 12 de outubro de 2014
Selfie integra nossa imagem ao mundo, sem separação
Selfie integra nossa imagem ao mundo, sem separação
Aurea Afonso Caetano
"Existo na medida em que puder ser visto no mundo; não mais existo para me refletir no mundo..."
Trouxe no texto passado (veja aqui), a ideia do confronto diário com o espelho como metáfora para a possibilidade de desenvolvimento da consciência de si, ou, autoconsciência.
Sabemos que o olhar da mãe ou cuidador é o primeiro espelho para o bebê, é nesse olhar que o recém-nascido vai ser reconhecido e validado em sua existência. É ao mesmo tempo o olhar do bebê que estimula a maternidade e o cuidado da mãe. Desde os primeiros momentos de vida o recém-nascido procura e reage ao olhar da mãe ou cuidador.
Isso acontece com todos os primatas. Quem não viu as fotos recém-postadas de uma chipanzé com seu bebê no colo, olhando para ele da mesma forma como as mães humanas fazem? Olhar de encanto, júbilo, reconhecimento e acolhimento, olhar que faz toda a diferença.
Somente mais tarde, por volta dos nove meses, o bebê começa a reconhecer-se em uma imagem refletida. No primeiro período de vida, ele vê sua imagem mas não a reconhece, pensa que é outra criança alí do outro lado e tenta fazer contato com ela. Num desenvolvimento normal em um determinado momento, por volta dos nove meses de idade, o bebê se reconhece no espelho; percebe então que aquela imagem refletida à sua frente é ele mesmo agora duplicado.
Então, falo do olhar da mãe como primeiro espelho, como primeiro reconhecimento; falei da conversa com o espelho como a possibilidade de autorreconhecimento. Quem sou eu, quem é o sujeito que do outro lado está à espreita, como posso me reconhecer e ampliar o conhecimento que tenho de mim mesmo ao estabelecer um diálogo interno, simbólico, com minha imagem refletida?
Isso tudo para chegar na questão sobre o atualmente tão famoso selfie. A fotografia que antes mostrava o que meus olhos viam, a paisagem ou o outro à minha frente, foi agora invertida. A foto mostra minha imagem na paisagem, com o outro ou comigo mesmo. É como se o foco da ação tivesse sido substituído - sai o outro e entro eu mesmo - I my self (eu e meu auto). Eu mesmo na festa bacana; eu mesmo na praia idílica, eu mesmo comendo o melhor cachorro-quente do mundo, no melhor show de todos os tempos - eu mesmo.
E como se minha existência só pudesse ser garantida através de uma comprovação. Existo na medida em que puder ser visto no mundo; não mais existo para me refletir no mundo, não existe mais uma separação eu-mundo, existo apenas enquanto estiver como que colado ao mundo.
E, se não há distância entre eu e outro, eu e mundo, então qual o espaço para o crescimento e o desenvolvimento? Estar colado ao mundo retira a possibilidade de espaço tridimensional; não há diálogo (que implica duas pessoas em conversa) há um monólogo. Não há espaço relacional, a existência está ficando "chapada".
Para onde caminhamos nós?
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